quarta-feira, 7 de julho de 2010

artigo

No país dos Fichas-sujas


Bruno Lima Rocha é cientista político

Publicação: 07.07.2010

A lei do Ficha-limpa, mesmo com todo o Lacerdismo nela contida, reflete um sentimento da cidadania melhor informada. Trata-se de uma iniciativa com amparo da população, uma arena conceitual onde a defesa republicana da representação coletiva vai de encontro e combate ao sentimento de vale-tudo materializado no clientelismo de baixa intensidade que graceja pelos colégios eleitorais brasileiros. Neste embate, é de se supor que qualquer operador, tanto político como jurídico, veja como positiva a vitória do republicanismo diante da relação de clientela para com os intermediários dos recursos da nação. Mas, ao afirmarem uma regra sem o procedimento necessário para sua implantação, como a checagem da vida pregressa antes do registro de candidaturas, o procedimento se torna mais importante do que a causa. Se alguém supõe que exagero, convido a lerem esta matéria, e esta também para reforçar a indignação.

Assim, ao invés de um avanço dos controles societários por sobre os aspirantes da carreira política profissional, teremos o reinado de intermediários e defensores legais. Não é de espantar que no Brasil do casuísmo reine a balbúrdia institucional. A suprema corte e os tribunais superiores legislam por jurisprudência, tomando o lugar das casas legislativas, que ordenam despesas através de emendas sem fim. Já o Executivo, faz de tudo um pouco, impondo-se pela força do orçamento e das indicações para os postos-chave da Justiça. O caos, gerado pelos cardeais da política brasileira, tende a favorecer estes mesmos operadores em funções-chave, através de ligações e relacionamentos.

Impressiona como a política brasileira consegue colocar na vala comum qualquer iniciativa de tipo popular ou cidadã, seja esta de cunho reivindicativo ou de moralismo republicano. Todo e qualquer debate ou estudo a respeito de gestão pública vai identificar na transparência de regras e procedimentos um bastião dos princípios da res publica. Ao mesmo tempo, a sabedoria popular já incorporou ao discurso das instituições políticas a noção de que se criam dificuldades para vender facilidades.

Infelizmente, as variáveis de regras casuísticas e patrimonialismo endêmico se encontram a todo o momento. Um mal reforça o outro e assim seguimos aos solavancos.

Um leitor desavisado poderia perguntar por que o Congresso não votara a lei através de um texto limpo, sem margens de interpretações mil e seguido de procedimento definido? No entendimento deste que escreve, não o fez porque tinha de atender a duas agendas. A primeira pauta atende o apelo da opinião pública em ano de pleito; já a redação confusa e a abertura para defesa dos atingidos mediante tecnicismos, atende o interesse dos próprios legisladores. Por fim, vale comentar que esta lei seria completamente desnecessária se os partidos políticos fizessem seus filtros já nas convenções. Mas aí já seria esperar demais.

Fonte: Bruno Lima Rocha é cientista político www.estrategiaeanalise.com.br / blimarocha@via-rs.net