segunda-feira, 16 de janeiro de 2012



ENTREVISTA » 


"Não acredito que existam bandidos de toga no RN", diz corregedor do TJ
O juiz não pode deixar de observar as leis processuais penais.A Constituição fala no direito à ampla defesa, no devido processo legal, no direito ao contraditório e dando todos os direitos possíveis. (Fábio Cortez/DN/D.A Press)
DESEMBARGADOR CLÁUDIO SANTOS DO TJ / RN


 Publicação: 15/01/2012 

O desembargador corregedor do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN), Cláudio Santos, disse, em entrevista a'O Poti/Diário de Natal, que todos os tribunais abrigam cargos comissionados indicados por políticos. Ao comentar a relação do judiciário com a classe política, ele disse que esse fator faz parte do sistema. 

"Existe a indicação de pessoas em todo o judiciário brasileiro", afirmou. Durante a entrevista, o desembargador anunciou também que o TJRN deverá fazer um mutirão em parceria com o Ministério Público (MP) para julgar processos de políticos que respondem por improbidade administrativa, principalmente os que estão em segunda instância. 

O objetivo, segundo ele, é dar celeridade aos casos que podem enquadrar futuros candidatos na Lei da Ficha Limpa. O desembargador também comentou os casos de corrupção no judiciário, defendeu o trabalho do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e comentou a morosidade da Justiça para julgar crimes contra o patrimônio público. 

Hoje, o Ministério Público tem se mostrado bastante atento aos crimes contra o patrimônio público. Inclusive, tem realizado várias operações para coibir esses atos e denunciar os responsáveis. No entanto, quando chegam à Justiça, os processos travam. O que pode ser feito para dar celeridade a essas ações? 

O judiciário não faz as leis. Quem faz as leis é o Congresso Nacional. Temos que observar as leis. O juiz não pode deixar de observar as leis processuais penais. A Constituição fala no direito à ampla defesa, no devido processo legal, no direito ao contraditório e dando todos os direitos possíveis. Esse sistema não foi implantado pelo judiciário, mas pelo legislativo. 

Mas, independentemente disso, concordo que o sistema oferece grandes possibilidades de que os processos terminem inócuos. No caso da questão de improbidade administrativa, é possível que a corregedoria, em parceria com o Ministério Público realize, neste ano, um verdadeiro mutirão, no sentido de apressar ou priorizar o julgamento desses processos. Já conversei com o promotor Manoel Onofre Neto sobre isso. Iremos ter eleições. Se a Lei da Ficha Limpa for realmente ter eficácia neste ano, nós vamos ter alguns casos que estão pendentes já julgados e resolvidos em segunda instância. A demora dos processos ocorre muito na primeira instância. Mas, no TJRN, estamos entre os cinco tribunais do Brasil que julgam com maior rapidez. A maioria dos processos cíveis são julgados em até 120 dias. Os processos penais nunca demoram mais de seis meses, no máximo um ano, dependendo das necessidades de complementação de instrução. O TJRN é um dos mais ágeis do Brasil, comprovadamente por estatísticas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). 

Nos últimos anos, foram denunciados vários crimes de corrupção envolvendo juízes no Brasil. No Rio Grande do Norte, existem bandidos de toga? 

Se há, eu não conheço. Não acredito que existam no Rio Grande do Norte esses bandidos de toga. De qualquer maneira, acho que para o corregedor, seja ele de qualquer órgão judiciário, quando diz que há bandido de toga está generalizando, atingindo a todos, colocando sob suspeita. Então, tenho a responsabilidade de dizer que não existe na corregedoria nenhum processo que eu possa dizer que existe bandido. Hoje, tramitam 15 processos na corregedoria em relação a juízes. Mas, a grande maioria diz respeito a questões processuais, atrasos e também a questão funcional, como processos de inaptidão para o exercício da magistratura. Mas, de desonestidade, de improbidade, não existe nenhum. 

Mas quando a ministra Eliana Calmon disse que existiam bandidos de toga, ela não generalizou. Ela disse que existiam, como há em outras áreas, essa faixa de profissionais desonestos no judiciário. Não houve generalização. Será que no Rio Grande do Norte não há nenhum juiz inserido nesse quadro de profissionais desonestos? 

Não. Eu acho que no Rio Grande do Norte é possível que existam juízes que não tenham vocação para a magistratura. Não vejo na magistratura do Rio Grande do Norte nenhum juiz improbo. A princípio, achoque não existe. Agora, defendo que a vocação para a magistratura possa ser averiguada no concurso ou até o prazo de dois anos. 

Nunca houve nenhum caso de denúncia de corrupção envolvendo juízes potiguares? 

Neste ano que estou à frente da corregedoria, não houve nenhuma denúncia. O que tivemos no ano passado foi um juiz que tinha transtornos mentais e saiu atirando no centro da cidade, ocasião em que a presidente do Tribunal mandou prendê-lo. Também tivemos um caso de juiz afastado que foi reintegrado aos quadros por uma decisão monocrática do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), exatamente porque ele não teria aptidão para o cargo. Mas, o Conselho decidiu reintegra-lo ao cargo. 

Segundo a ministra Eliana Calmon, as corregedorias estaduais protelam os processos contra juízes até perderem o prazo. O sr. não se sente constrangido em investigar os próprios colegas de tribunal? 

Não. O sistema hoje é o ideal, que diz que o CNJ pode investigar diretamente. Mas, nem o CNJ tem estrutura para investigar 96 tribunais do Brasil. É um órgão ainda pequeno, com pouca estrutura de pessoal. Agora, se a corregedoria não investigar, cabe ao CNJ fazê-lo, como já veio ao Rio Grande do Norte duas vezes. Levantou tudo, abriu todos os armários. 

Cabe ao CNJ verificar o que estiver errado. Na corregedoria do Rio Grande do Norte, os processos nunca passaram mais do que 90 dias. São julgados pelo tribunal ou arquivados pelo corregedor, quando não há nenhuma prova. Mas, todas as decisões obrigatoriamente contra juízes vão cópias para o CNJ examinar. Todas as decisões são revistas pelo Conselho Nacional de Justiça. Então, este problema de corporativismo só existirá se as decisões não forem de conhecimento do CNJ, inclusive desmoralizando o corregedor, que faz o seu trabalho. 

Nas relações pessoais entre juízes e governantes, não há um comprometimento da isenção do magistrado na hora de tomar decisões que contrariem interesses desses governantes? 

É preciso que a opinião pública entenda que os Tribunais de Justiça são poderes do estado membro,diferentemente do Tribunal Federal, do Trabalho, do Militar. Então, obrigatoriamente, o presidente do Tribunal Federal, por exemplo, não tem que ter relação com nenhum governador. 

No do Trabalho, que tem a maior estrutura de cargos comissionados do Brasil, inclusive muitos indicados por políticos, também não tem nenhuma obrigação de se relacionar com o governante. O Tribunal Regional Eleitoral (TRE) muito menos. Mas o Tribunal de Justiça tem que ter relações com o Legislativo e o Executivo, porque são poderes do estado, harmônicos e independentes, como diz a Constituição. É preciso haver uma relação político-institucional, por isso os tribunais são tão visados nas averiguações do CNJ. 

A ligação política de um juiz, na sua opinião, influencia nas decisões que ele vai tomar, desde o pedido de quebra de sigilo bancário e telefônico até o julgamento de uma ação? 

Não sei. Não posso responder em tese se pode ou não pode. No mundo, tudo é possível. Já vi tanta coisa que não esperava ver na minha idade. Estou com 57anos... 

O sr. citou que o Tribunal do Trabalho é o que tem mais cargos comissionados indicados por políticos. Como funciona isso? 

Todos os tribunais têm. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte tem, o Tribunal Regional Eleitoral tem, o Superior Tribunal de Justiça tem, o Supremo tem, porque vivemos numa vida política. Quem manda no Brasil são os políticos. 

POSTADO PELO DN ONLINE / DIÁRIO DE NATAL