quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Hígia: defesa de Eleonora Castim diz que juiz foi “induzido em erro”

Hígia: defesa de Eleonora Castim diz que juiz foi “induzido em erro”

Publicação: 04.02.2010

O juiz Mário Azevedo Jambo, da 2ª vara Federal do Rio Grande do Norte, foi “induzido em erro” ao decretar a prisão de Maria Eleonora Castim na operação Hígia. Esse é o teor da defesa apresentada pela ex-coordenadora de Orçamento e Finanças da Secretaria Estadual de Saúde Pública (Sesap), que é ré no processo que apura uma suposta rede fraudulenta que operava dentro da pasta. O portal TN Online teve acesso com exlusividade ao documento, que já foi entregue na segunda vara Criminal da Justiça Federal.

A defesa de Eleonora, concluída em 19 de jan
Carlos Castim apresentou  defesa de Eleonora e apontou "erros"Carlos Castim apresentou defesa de Eleonora e apontou "erros"
eiro passado, foi elaborada pelo advogado e ex-secretário de Segurança Pública e Defesa Social (Sesed), Carlos Castim. Os dois são casados.

Segundo o advogado, o juiz foi “induzido em erro” pelo delegado da Polícia Federal Caio César Marques Bezerra para formar um juízo de pré-julgamento dentro do contexto acusatório no qual Eleonora Castim foi envolvida.

“o juiz decretou a prisão temporária de sem que estivessem presentes as condições mínimas de autoria e materialidade (ausência dos elementos constitutivos da estrutura do fato punível), sem atentar para a deficiência investigatória e para existência de graves nulidades processuais (obtenção de interceptações telefônicas ilícitas em desacordo com a lei 9.296/96”, salientou Castim.

“Eu analisei item por item todos os documentos que compõem o volumoso processo penal. Estudei o inquérito policial, a denúncia, ouvi cuidadosamente todos os mais de 500 áudios de interceptações telefônicas que foram produzidos. E posso afirmar com absoluta convicção que não há nada, não há um indício sequer que possa relacionar a conduta funcional de Eleonora Castim com as acusações penais que lhe são feitas”, afirmou Carlos Castim, que pediu exoneração do cargo de secretário de Segurança poucos dias após a prisão da mulher.

Para Castim, o juiz Mário Jambo “não poderia ter recebido uma denúncia contendo tantas irregularidades processuais e muito menos fundado a sua decisão no vetusto princípio inquisitorial do in dubio pro societatis, ou seja, na dúvida”. No entender do advogado, “esse princípio é totalmente incompatível com o estado democrático de direito, tratando-se de um mecanismo acusatório medieval e antigarantista”.

No documento, Castim arrola como testemunhas de defesa de Eleonora oito pessoas, entre elas os ex-secretários de Saúde do Estado Ives Alberto Lourenço Bezerra, Rui Pereira dos Santos e Adelmaro Cavalcanti Cunha Júnior.

Na entrevista ao TN Online, Carlos Castim, que ocupou um cargo de confiança no Governo Wilma de Faria, também falou da atual relação com a chefe do executivo estadual. Segundo Castim, desde ele foi exonerado da Sesed nunca mais manteve qualquer contato com a governadora. Veja a entrevista.

TN Online - Maria Eleonora tem alguma culpa nessa suposta rede fraudulenta investigada na operação Hígia?
Carlos Castim - “Absolutamente não. Tanto o relatório policial, quanto a denúncia do Ministério Público Federal, que reproduz literalmente o primeiro em relação a Maria Eleonora Castim, não demonstram qualquer tipo de acusação consistente ou conduta delituosa que possam justificar o seu enquadramento nos tipos penais mencionados pela denúncia”.

TN - Baseado em que o senhor diz isso?
CC - “As acusações são profundamente genéricas, imprecisas, totalmente infundadas E baseadas exclusivamente em conversas telefônicas que não reproduzem ou caracterizam qualquer tipo de conduta penal ou ação delituosa. Ademais, a denúncia contém erros acusatórios graves, nulidades processuais e ainda omite provas que foram levantadas durante a investigação policial favoráveis à comprovação de inocência de Maria Eleonora”.

TN - Que erros seriam esses?
CC - “Por exemplo: a denúncia aponta que Eleonora recebeu passagens aéreas e o indício probatório correspondente comprova ter sido uma pessoa totalmente estranha aos quadros da Secretaria de Saúde do Estado quem as recebeu. a denúncia imputa à Eleonora castim a responsabilidade por haver dispensado e promovido a inexigibilidade de procedimentos licitátórios, atribuições estas exclusivas dos secretários de Estado e ordenadores de despesas das Secretarias. Eleonora Castim, nunca foi ordenadora de despesas da Sesap, jamais trabalhou com licitações e sequer integrou qualquer setor responsável por tais procedimentos. citamos a lei complementar Nº 168/1999, que estabelece expressamente tal disposição. Ademais estão imputando a Eleonora Castim condutas que sequer configuram crime”.

TN - Existem outros falhas nos autos?
CC - “Sim. provas favoráveis a comprovação da inocência de Maria Eleonora Castim foram acintosamente omitidas dos autos pela autoridade policial. Não há qualquer empenho, ordens bancárias, contratos, aditivos, autorizações de pagamentos nos autos que contenha a assinatura de Eleonora Castim. Toda a acusação está assentada exclusivamente em áudios cujo conteúdo nada revelam de irregular. aliás, no pedido de prisão temporária de Eleonora Castim datado de 20 e maio de 2008 não há qualquer referência sobre a sua participação nas prorrogações dos contratos 32 e 33 que tratam sobre a higienização hospitalar, celebrados entre a A&G e Líder Limpeza Urbana com a Sesap). Em nenhum momento da abordagem que a denúncia ministerial faz ao contrato 33 é sequer citado o nome de Eleonora Castim. Repentinamente ela já aparece nos últimos treze dias da investigação policial, como responsável pela dispensa e inexigibilidade de procedimentos licitatórios. Com base em que é feita tal acusação?”.

TN - Se há tantas falhas na investigação, por que o juiz Mário Jambo acatou a denúncia contra Eleonora Castim?
CC - “A operação Hígia foi essencialmente midiática, espetaculosa. afinal nela estão envolvidos um ex-secretário de Estado, empresários, o filho da governadora a esposa de um ex-secretário de Segurança Pública. É inegável a existência de uma pressão social por parte daqueles que só conhecem um lado do fato. Acredito que tenha faltado maturidade julgadora e isenção para saber lidar com isso. Além disso, o juiz Mário Azevedo Jambo não atentou para o fato de que Maria Eleonora teve a sua prisão solicitada sem sequer ter sido investigada, de acordo com que prova o ofício 4197/2008, do dia 20 de maio, da Polícia Federal. Nesse ofício, o nome de Eleonora sequer estava citado no rol de pessoas investigadas. Somente seis dias após esse pedido é que o delegado Caio Bezerra, percebendo o abuso cometido, e visando uma aparência de legalidade ao ato praticado, decidiu solicitar a quebra do sigilo telefônico e Eleonora, mencionando-a como uma das pessoas já investigadas no processo”.

TN - Qual o tipo de relação que sua mulher tinha com os demais denunciados?
CC - “Exclusivamente profissional. Durante toda a investigação, a denúncia só aponta contatos de Eleonora Castim com Anderson Miguel e Herberth Florentino, que eram empresários prestadores de serviço à Sesap e, por exigência do cargo que ocupava, ela tinha obrigação funcional de prestar todas as informações referentes à tramitação de processos. Assim como é natural que qualquer pessoa que exerça o cargo de coordenador de orçamento e finanças da Sesap tenha essas mesmas atribuições. Trata-se, portanto, de um dever funcional e não de qualquer atenção graciosa da parte dela”.

TN - Eleonora tinha que funções na Sesap?
CC - “Ela era responsável pela confecção dos processos de pagamento aos prestadores de serviço da Secretaria envolvendo a elaboração do empenho, a verificação da despesa e a sua preparação final para pagamento por parte do ordenador de despesa. Ela não era e nem nunca foi ordenadora de despesa, repito”.

TN – A sua mulher foi investigada durante quanto tempo?
CC - “Dos 19 meses de investigação, ela foi investigada em 13 dias, justamente os que antecederam a deflagração da operação Hígia. Ou seja, a investigação dela se deu exclusivamente entre os dias 27 de maio e 10 de junho de 2008”.

TN - Só foi quebrado o sigilo telefônico dela ou mais algum outro?
CC - “Sim, e uma única vez. Nós também disponibilizamos as quebras dos sigilos fiscal e bancário para a Polícia Federal, mas o delegado Caio Bezerra considerou desnecessário investigar tais fatos certamente em virtude das relevantes funções de Eleonora Castim na organização criminosa. Ora, diante disso, é pertinente acreditar que uma pessoa está sendo acusada de ser responsável pela irrigação financeira da quadrilha seja investigada apenas nos últimos 13 dias da investigação e, mesmo assim, tão somente através de interceptações telefõnicas? A Polícia Federal não se deu sequer ao trabalho de saber como funcionava a Coordenadoria de Orçamento e Finanças da Sesap”.

TN - O senhor tinha uma certa proximidade com a governadora Wilma de Faria, chegando a ocupar um cargo de confiança dela. Isso pode ter influenciado diretamente na prisão da sua mulher?
CC - “O que influenciou foi o cargo que eu ocupava. Sobre essa pergunta quem pode responder A contento são os idealizadores do pedido de prisão temporária de Eleonora Castim”.

TN - O senhor hoje mantém essa proximidade com a governadora?
CC - “Não”.

TN - Por quê?
CC - “Porque desde a minha saída do Governo, nenhum contato mais foi mantido”.

TN - Quais os reflexos desse episódio na sua vida e na vida de Maria Eleonora?
CC - “Encaro esse episódio como uma perversidade imensurável em nossas vidas profissional e familiar. Qualquer pessoa que sofra a injustiça de um processo penal já está estigmatizada socialmente. Para sempre. Qualquer pessoa sensata, de bom senso e com um mínimo sentimento de justiça sabe da desproporcionalidade e dafalta de razoabilidade desse injusto penal praticado contra a pessoa de Maria Eleonora Castim. Se ela está nas mãos da justiça humana, entrego nas mãos de Deus os seus responsáveis. Para que eles respondam por isso perante a justiça divina. É, pois, como eu digo na abertura da peça de defesa, citando Franz Kafka na obra O Processo: ‘Alguém devia ter caluniado Josef K., sem que tivesse mal algum, ele foi detido certa manhã’”.

TN - Se provada a inocência de Eleonora Castim, o senhor pretende pedir uma indenização à União?
CC - “Não tenho a menor dúvida da inocência de Eleonora. Entretanto considero que o momento atual é de total concentração no desfecho de sua absolvição sumária”.